Políticas públicas no Brasil de combate à miséria e à pobreza pós constituição federal de 1988

1. Introdução

Não há como negar que a desigualdade social é um fato existente no Brasil. Uma das consequências trazidas pela desigualdade é a pobreza e a miséria.

Cabe ao Brasil, Estado que se intitula de Social e Democrático em sua Constituição Federal, instituir políticas públicas, de modo a minorar estas consequências trazidas pela desigualdade.

O presente artigo tem por escopo analisar os Programas Governamentais de combate à pobreza, dentre eles e, em especial, o Bolsa Família, criado pelo governo Lula, com a intenção de retirar pessoas do nível de miséria.

O Bolsa Família é um dos principais programas de combate à fome no Brasil e, para muitos de seus beneficiários, é a única possibilidade de obtenção de uma renda.

Analisar-se-ão, também, os índices atuais da miséria e pobreza no Brasil, apontados em pesquisas realizadas pelos órgãos especializados, tais como IPEA, DIEESE, FGV, etc.

2. Cidadania e direitos sociais no Brasil

Segundo José Murilo de Carvalho, o fenômeno da cidadania é complexo e historicamente definido.[1]

Garantir direitos como a liberdade e o voto não significa que outros, como a segurança e o emprego, serão assegurados. Exercer o voto não garante a existência de governos atentos aos problemas básicos da população.

A cidadania inclui várias dimensões e umas podem estar presentes sem as outras. Uma cidadania plena, com a presença da liberdade, participação e igualdade para todos, é um ideal desenvolvido no Ocidente e talvez inatingível.

Tornou-se costume dividir a cidadania em direitos civis, políticos e sociais. O cidadão pleno seria aquele que titularizasse os três níveis de direitos. No entanto, é possível, por exemplo, haver direitos civis sem os direitos políticos. Entretanto, o contrário não é verdadeiro, pois sem os direitos civis (em especial, a liberdade de opinião e organização) os direitos políticos, sobretudo o voto, podem existir formalmente, mas ficam esvaziados de conteúdo e servem antes para justificar governos do que para representar cidadãos.

Há também os direitos sociais. Se os direitos civis garantem a vida em sociedade, se os direitos políticos garantem a participação no governo da sociedade, os direitos sociais garantem a participação na riqueza coletiva. A garantia de sua vigência depende da existência de uma eficiente máquina administrativa do Poder Executivo.

Os direitos sociais permitem às sociedades politicamente organizadas reduzir os excessos de desigualdade produzidos pelo capitalismo e garantir um mínimo de bem-estar para todos. A ideia central em que se baseiam é a da justiça social.

3. A redução da pobreza como um dos objetivos da constituição federal de 1988

O artigo 3º da Constituição Federal de 1988 elenca os objetivos da República Federativa do Brasil. Dentre tais objetivos, mais especificamente no inciso III, está a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais.

O citado inciso parte do princípio de que o papel do Estado é o de garantidor de prestações positivas de natureza material, prestações essas aptas a concretizar a dignidade do ser humano dentro dos patamares mínimos de sobrevivência.

O mínimo existencial está intimamente ligado à questão da pobreza. Ao contrário da Constituição do Japão, que prevê expressamente que todos terão direito à manutenção do padrão mínimo de subsistência cultural e de saúde, a Constituição Federal de 1988 não o proclama em cláusula genérica e aberta, mas apenas limita-se a estabelecer que a erradicação da pobreza constitui objetivo fundamental da República Federativa do Brasil.[2]

Segundo Ricardo Lobo Torres, o mínimo existencial carece de conteúdo específico, podendo abranger qualquer direito, ainda que originariamente não-fundamental, tais como, o direito à saúde, à alimentação, à moradia, etc.[3]

O mínimo existencial não possui dicção constitucional própria, devendo-se procurá-lo na ideia de liberdade, nos princípios da igualdade, do devido processo legal, da livre iniciativa, nos direitos humanos, nas imunidades e privilégios do cidadão.

A questão do mínimo existencial confunde-se com a própria questão da pobreza. Necessário se faz distinguir pobreza absoluta de pobreza relativa. A primeira deve obrigatoriamente ser combatida pelo Estado. Já, a segunda, relaciona-se a causas de produção econômica ou redistribuição de bens, a qual será diminuída conforme as possibilidades sociais e orçamentárias. Não existe um conceito fechado de pobreza absoluta, vez que ela varia no tempo e no espaço.

O fundamento do direito ao mínimo existencial relaciona-se às condições para o exercício da liberdade. A dignidade humana e as condições materiais da existência não podem ficar abaixo de um mínimo.[4]

Alem do exercício da liberdade, o mínimo existencial relaciona-se com o problema da felicidade do homem. Aristóteles afirmava que é obrigação do Estado garantir boa qualidade de vida, a qual é sinônimo de felicidade e da qual somente não participavam escravos e animais, uma vez que estavam privados da liberdade de escolha.[5]

O mínimo existencial pode surgir também da inserção de interesses fundamentais nos direitos políticos, econômicos e sociais. Os direitos à alimentação, saúde e educação inserem-se dentre aqueles que adquirem o status daqueles sem os quais o homem não sobrevive. Alexy utiliza a expressão “direitos sociais fundamentais mínimos” para descrever o fundamento do mínimo existencial.[6]

Utilizando-se do direito comparado pode-se citar o caso da Suprema Corte Americana, no julgamento de inúmeros mandados de injunção. No julgamento destes, passou-se a estender a noção de “direitos constitucionais” a todos aqueles direitos indispensáveis à sobrevivência, com um mínimo de dignidade.

Embora a Constituição Federal de 1988 não preveja, expressamente, o direito ao mínimo existencial, a legislação infraconstitucional e a de direito internacional o faz.

A Lei Federal 8.742, de 07.12.93, por exemplo, se refere ao mínimo existencial., no art 1º:

“A assistência Social, direito do cidadão e dever do Estado, é política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.”

O artigo 25, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, também se refere ao mínimo existencial:

“Toda pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para assegurar a sua saúde, o seu bem-estar e o de sua família, especialmente para a alimentação, o vestuário, a moradia, a assistência médica e para os serviços sociais necessários.”

O mínimo existencial é direito fundamental, vinculado à Constituição, sendo irrelevante a existência de lei para sua obtenção. As normas que conferem direitos econômicos e sociais classificam-se como normas programáticas, ou seja, as que definem objetivos cuja concretização depende de providencias situadas fora ou alem do texto constitucional.[7]

Conclui-se que o mínimo existencial é um direito pré-constitucional, não positivado na Carta Magna, mas implícito no artigo 3º, inciso III, como sendo um dos objetivos da República Federativa do Brasil a erradicação da pobreza e da marginalização.

Assim, compete ao Estado propiciar meios de acesso aos direitos considerados mínimos à sobrevivência e à dignidade de seus cidadãos.

Entretanto, é necessário ressaltar que a ação estatal deve se restringir à entrega de bens necessários à sobrevivência dos pobres, pois ao Estado não compete a concessão de bens e serviços a toda a população.

Os artigos 6º e 7º da Constituição de 1988 positivam os direitos sociais.

Os direitos sociais revestem a forma de princípios de justiça, de normas programáticas. Na doutrina alemã, esses direitos aparecem com a denominação de “direitos fundamentais sociais”, face a sua constitucionalização, principalmente por meio da cláusula do Estado Social. No entanto, segundo a maior parte dos doutrinadores alemães que a adotam, esses direitos fundamentais sociais são limitados pela “reserva do possível” e constituem meras diretivas para o Estado. Não se confundem com os direitos da liberdade nem com o mínimo existencial.[8]

O mínimo existencial é direito subjetivo protegido negativamente contra a intervenção do Estado e, ao mesmo tempo, garantido positivamente pelas prestações estatais.[9]

Para se concretizar, o mínimo existencial, tanto pelo seu aspecto negativo como pela necessidade de proteção positiva, carece do processo democrático, da participação de todos os entes da federação.

Como liberdade normativa que é, o mínimo existencial pode ter suas garantias aperfeiçoadas pelo poder regulamentar do Executivo. Na qualidade de direito subjetivo, o mínimo existencial é oponível à Administração, gerando para esta a obrigação de entregar a prestação de serviço público independentemente do pagamento de qualquer tributo ou de contraprestação financeira. A violação do direito, seja por ação ou omissão, justifica o controle jurisdicional.

Há inúmeros instrumentos judiciais para garantia do mínimo existencial, seja na via ordinária ou por meio de processos constitucionais. Dentre os últimos há por exemplo, o mandado de segurança, o mandado de injunção e a ação de inconstitucionalidade por omissão.

O Estado deve intervir para corrigir as desigualdades sociais e isso se faz por meio de políticas públicas.

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