Os direitos sociais à luz da teoria de justiça de Amartya Sen

AuthorFernando Borba de Castro
PositionUniversidade de Lisboa, Lisboa, Portugal
Pages153-174
Revista inteRnacional de Pensamiento Político - i ÉPoca - vol. 14 - 2019 - [153-174] - issn 1885-589X
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OS DIREITOS SOCIAIS À LUZ DA TEORIA DE
JUSTIÇA DE AMARTYA SEN
SOCIAL RIGHTS UNDER THE AEGIS OF AMARTYA SEN’S
THEORY OF JUSTICE
Fernando Borba de Castro
Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal
fernandoborb@hotmail.com
Recibido: abril de 2019
Aceptado: diciembre de 2019
Palavras-chave: Amartya Sen; Direitos Humanos; Direitos Sociais; Capacidades; Justiça Social.
Keywords: Amartya Sen; Human Rights; Social Rights; Capabilities; Social Justice.
Resumo: Este estudo tem como objetivo apresentar e discutir os direitos so-
ciais à luz da teoria de justiça de Amartya Sen. A abordagem das capacida-
des do economista indiano descortina uma perspectiva comprometida com
o progresso das obrigações oriundas dos direitos humanos e imprescindíveis
à produção de um Estado Constitucional Social. O foco nas necessidades
das pessoas assoladas por privações nos permite avançar na investigação da
natureza dos direitos sociais, assim como na questão de em que medida são
direitos humanos e constitucionais. Relacionando-o a autores como Martha
Nussbaum e Miguel Nogueira de Brito, estudamos o impacto da positivação
dos direitos prestacionais nas Constituições e buscamos uma alternativa à
sua concretização exclusivamente por intermédio de um processo de judi-
cialização.
Abstract: The aim of this study is to exhibit and discuss social rights under
the aegis of Amartya Sen’s theory of justice. The Indian economist’s approach
of capabilities reveals a prospect committed to the progress of human rights
obligations and essential to the production of a Social Constitutional State.
Focusing on the needs of people beset by deprivation allows us to advance
in the investigation of the nature of social rights, as well as in the extent to
which they are human and constitutional rights. Relating it to authors such
as Martha Nussbaum and Miguel Nogueira de Brito, we study the impact
of the positivation of the benet rights in the Constitutions and we look for
an alternative to its concretization by means of a process exclusively of
judicialization.
Revista inteRnacional de Pensamiento Político - i ÉPoca - vol. 14 - 2019 - [153-174] - issn 1885-589X
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1. Introdução
Com este estudo apresentaremos e discu-
tiremos os direitos sociais à luz da teoria
de justiça de Amartya Sen1. Exporemos
as contribuições do autor à pesquisa
acerca da natureza jusfundamental dos
direitos sociais. Então, vericaremos de
que maneira o horizonte propicia uma
compreensão de tais direitos atenta à par-
ticularidade da sua conexão ao bem-estar
social das comunidades políticas. Por m,
discutiremos se a teoria deixa pontos em
aberto para evoluirmos na investigação
da natureza e da efetividade dos direitos
sociais.
A Declaração Universal de Direitos Hu-
manos de 1948 é um marco no desen-
volvimento de novos direitos. Arma uma
singular «geração» ou «dimensão» de
prerrogativas2, associadas não à limitação
1. Esta investigação adota como ponto parcial de
partida algumas reexões e debates suscitados no
âmbito do programa de mestrado em Ciências Ju-
rídico-Políticas da Faculdade de Direito da Uni-
versidade de Lisboa no ano letivo de 2017/2018.
O núcleo da pesquisa foi apresentado na forma
de relatório da unidade curricular de Ciência Po-
lítica, com o título A justiça como capacidades
humanas na teoria de Amartya Sen. Naturalmen-
te, a investigação foi largamente remodelada e
ampliada, notadamente através de abrangente
atualização bibliográca.
2. Em atenção à perspectiva da evolução dos
direitos, é importante registrar que o empre-
go do termo «geração» é controverso no meio
cientíco. Ingo Sarlet desponta entre os críticos
da terminologia, preferindo adotar a palavra «di-
mensão». Segundo ele, a ideia de «dimensão»,
além de apontar para o caráter cumulativo do
processo evolutivo e para a natureza comple-
mentar dos direitos fundamentais, expressa sua
unidade e indivisibilidade no contexto do direito
constitucional. A trajetória dos direitos envolve
um processo de constante transformação, culmi-
nando com a recepção, tanto nos catálogos cons-
do poder do Estado, mas à sua atuação
positiva para promover a melhoria global
nas condições de vida das pessoas. A
concretização da dignidade humana re-
quer a realização da igualdade entre os
indivíduos, e a Declaração de 1948 evi-
dencia o papel dos poderes públicos e da
sociedade nesta tarefa.
Nesta seara, algumas democracias cons-
titucionais do segundo pós-guerra positi-
varam prestações sociais em suas Cartas
Magnas. É o que acontece, exemplicati-
vamente, com a Constituição italiana de
1947, a portuguesa de 1976, a espanhola
de 1978 e a brasileira de 1988. Então, a
construção de um Estado Constitucional
Social, alicerçado na dignidade humana,
passa a ser um imperativo do direito, e
não uma intenção de justiça desprovida
de juridicidade.
Muitas privações de caráter econômico
e social atingem a humanidade, espe-
cialmente países em desenvolvimento: a
fome, a falta de cuidados médicos, a ne-
gação à educação, o labor em condições
indignas ou sem uma remuneração que
atenda às necessidades mais básicas das
pessoas, explicitam graves problemas
mundiais. À medida que a evolução do
bem-estar social adquire, para além da
desejabilidade política e social de suas
metas, clara relevância jurídica, a atenção
da investigação cientíca volta-se à efeti-
titucionais quanto na esfera do Direito Interna-
cional, de múltiplas e variadas posições jurídicas,
cujo conteúdo é variável, como as transforma-
ções ocorridas na realidade social, política, cul-
tural e econômica ao longo dos tempos (Sarlet,
2007: 51-53). Concordamos com a ressalva ao
termo «geração», preferindo a adoção da palavra
«dimensão». Utilizamos ambos os termos neste
estudo, mas não desconhecemos a divergência
teórica descrita e tampouco os tratamos como se
fossem sinônimos.

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