Propriedade e a Função Socio-Ambiental

AuthorMagali Regina Fuck Negosek - Álvaro Borges de Oliveira

Magali Regina Fuck Negosek: Mestranda do Programa de Mestrado Acadêmico em Ciência Jurídica da Universidade do Itajaí UNIVALI, Especialista em Direito Público Municipal, Especialista em Direito ProcessualCivil, graduada na UNIVALI, Campus III, Tijucas SC.

Álvaro Borges de Oliveira: Professor titular dos Cursos de Doutorado, Mestrado e Graduação em Ciência Jurídica na Universidade do Vale do Itajaí. Possui nove obras publicadas, além de vários artigos em revistas e periódicos. Graduado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (2002), graduação em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Santa Catarina (1984), mestrado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (1992), mestrado em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí (2005) e doutorado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2000).

Introdução

O propósito deste artigo inicia com a Revolução Francesa. Para encetar a pesquisa inicia-se com o pensamento de John Locke3, o qual estabelecia a Propriedade como um direito natural e individual a qual estava diretamente ligado ao trabalho, segundo ele, “[...] a extensão de terra que um homem lavra, planta, melhora, cultiva e de cujos produtos desfruta, constitui a sua propriedade”.

A propriedade é fenômeno sociológico reconhecido pelo direito a partir da Revolução Francesa, movimento que teve seu ápice ideológico na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, adotadana França em 1789, no Artigo 17, em que a propriedade privada restou consagrada como um direito inviolável e sagrado.

Essa consagração da propriedade privada também é assente na Constituição da Republica Federativa do Brasil de 19884, que contém vários dispositivos sobre a propriedade, a qual se encontra inserida como direito e garantia fundamental, no caput do art. 5°, juntamente com os direitos àvida, à liberdade, à igualdade e a segurança.

O inciso XXII garante o direito de propriedade, que deve atender à sua função social, prevista no inciso XXIII, assegurada a justa e prévia indenização na hipótese de desapropriação no caso de necessidade ou utilidade pública.

A CRFB/88 também estabeleceuma estreita conexão entre as normas do meio ambiente e as normas respectivas ao direito de propriedade, integrando-os nos princípios gerais da Ordem Econômica previstos no Artigo 170, II, III e VI, respectivamente.

Ao tratar da Política Urbana, a CRFB/88 estabelece a necessidade de que a propriedade urbana cumpra sua função social (Artigo 182, § 2°). Também em relação à política agrícola e fundiária e da reforma agrária, a CRFB/88, no Artigo 184 estabelece que o imóvel rural deve cumprir sua função social com seus respectivos requisitos citados no Artigo 186.

Menciona Figueiredo5:

[...] se o art.170 da Constituição da República estabelece o principio Constitucional da função Social dos bens de produção, o art. 186 busca coibir a improdutividade (e também, a produção obtida por meio ilícitos) na propriedade rural e o art. 182 visa reprimir a especulação imobiliária na propriedade urbana, sem descuidar da proteção ambiental. (grifos do original)

Como remate desta introdução, percebe-se que não é mais possível falar em propriedade privada, absoluta e ilimitada. Atualmente a propriedade sofre sim limitações, restrições e Inserção Social6, pois deve cumprir além dos interesses do particular, também a função social e a função ambiental, esta afirmação será enriquecida com a análise que segue.

1. Direito de Propriedade

Neste item trata-se do Direito de Propriedade, visto como sendo o Direito Real Subjetivo, e não a Propriedade. O direito de propriedade, como anuncia Salles7, tem sido entendido de maneira diversa pelos povos, no tempo e no espaço, em razão das diferenças existentes entre os sistemas econômicos e jurídicos que adotaram. Em um momento a propriedade privada é tida como condição indispensável ao progresso social, e, em outro, esse ela passa a ser limitado ou até suprimido, encarada como obstáculo que emperra a produção e impede a justa distribuição da riqueza. Como se pode constatar, um mesmo fenômeno, a propriedade, assume nuanças que por vezes apontam direções diametralmente opostas.

A propriedade é um antigo instituto do Direito Privado, que no atual ordenamento jurídico, o Código Civil, no Artigo 1228, prevê que: “o proprietário tem a faculdade de usa, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”. Diante deste dispositivo, é possível observar que o conceito da propriedade não é exposto, mas sim é previsto os direitos daquelesque possuem o direito à propriedade. Dessa forma, o legado deixado pelo ordenamento jurídico sobre propriedade acaba sendo interpretado pela doutrina.

Para Loureiro8 “[...] o texto legal põe em relevo não a estrutura ou a natureza da propriedade, mas sim as prerrogativas do sujeito indicado como proprietário.” Ou seja, em nosso entendimento o mencionado dispositivo salienta os direitos consubstanciados no direito de propriedade, ou melhor dizendo o direito real subjetivo, contendo os elementos constitutivos de usar, gozar, dispor e reivindicar a coisa.

Os conceitos clássicos de propriedade giram, com maior ou menor variação, em torno do conteúdo e dos poderes do proprietário e podem resumir-se, conforme Rodotá9 “[...] la propriedad (o el poder del proprietário) consiste en la possibilidad de hacer del objeto todo aquello que no está vedado por lei”.

Gomes10 conceitua a propriedade sob a análise conjunta de alguns critérios, expondo que:

Sinteticamente, é de se defini-la [...] como a submissão de uma coisa, em todas as suas relações, a uma pessoa. Analiticamente, o direito de usar, fruir e dispor de um bem, e de reavê-lo de quem injustamente o possua. Descritivamente, o direito completo, absoluto, perpétuo e exclusivo, pelo qual uma coisa fica submetida à vontade de uma pessoa, com as limitações da lei.

Portanto, a propriedade seria a situação de uma coisa sujeita a uma pessoa, que por meio desta submissão gera direitos sobre a referida coisa, sendo um direito caracterizado pela sua complexidade, absolutismo, perpetuidade e exclusividade, sob uma limitação legal.

Até este momento, foi apresentado o conceito clássico de propriedade, entretanto, na visão contemporânea do direito privado, é importante ressaltar que a clássica definição de propriedade não encontra sintonia com a teoria atual do direito de propriedade e sua finalidade.

2. Constitucionalização do Direito de Propriedade

O conceito clássico de propriedade originou-se numa época em que o ordenamento jurídico tratava-se de um sistema fechado e, que esta característica, contribui para o distanciamento da norma a realidade social. Entende Loureiro11 que:

Os conceitos tradicionais partemda noção de direito subjetivo e estão fincados exclusivamente nos Códigos Civis, que seguem os modelos da segunda e terceira codificação [...], ou seja, inspirados no positivismo [...] Já os conceitos contemporâneos, [...] vêem a propriedadecomo um status, ou como uma relação jurídica complexa, carregada de direitos e deveres, inspirados em valores constitucionais e no principio da função social.

Portanto, o Direito de Propriedade é absoluto até o momento em que se discute o mesmo entre...

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