A natureza normativa da ordem jurídica internacional

AuthorLeonardo Nemer Caldeira Brant - Délber Andrade Lage
PositionDoutor em Direito Internacional Público pela Université Paris X, França. Presidente do Centro de Direito Internacional. Professor da Faculdade de Direito da UFMG e da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - Doutorando em Direito Internacional Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Diretor do Centro de Direito ...
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A Natureza Normativa da Ordem Jurídica Internacional 73
A Natureza Normativa da Ordem Jurídica Internacional
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Resumo
O presente artigo tem como objetivo demonstrar a natureza normativa do Direito
Internacional dentro da ordem jurídica internacional. Para tal, apresenta as principais
correntes doutrinárias relativas à sua fonte de obrigatoriedade, analisadas sobre o espectro
da evolução de casos da Corte Permanente de Justiça e da Corte Internacional de Justiça.
Palavras-chave
Direito Internacional, obrigatoriedade, voluntarismo, objetivismo, normativismo
Abstract
This paper aims to demonstrate the normative nature of internacional law within
the international legal order. For such, it presents the major doctrinal and theoretical
lines, relating to its source of obligation, on the spectrum analysis of the evolution
in the cases of the Permanent Court of Justice and the International Court of Justice.
Keyword
International law, obligatoriness, voluntarism, objectivism, normativism
I – A natureza normativa da ordem jurídica internacional
Se por um lado, na origem e em seus princípios elementares, o direito internacional
se distingue do direito interno, por outro, deve-se reconhecer que ambos são sistemas
normativos e estão inseridos em um determinado ambiente social. Conseqüentemente
inexiste uma obrigação jurídica isolada. Qualquer produção normativa está sempre
atrelada a uma ordem jurídica que lhe confere um sentido e um alcance determinado.
A norma não é um fato destacado do conjunto, é uma peça na formação de um sistema
coerente. Conceituando o direito internacional como um sistema normativo aplicado
a sociedade internacional, o direito internacional é evidenciado não apenas como um
conjunto de normas, mas um sistema jurídico coeso e uniforme3. Afinal, um conjunto
1 Doutor em Direito Internacional Público pela Université Paris X, França. Presidente do Centro de Direito Internacional. Professor da
Faculdade de Direito da UFMG e da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
2 Doutorando em Direito Internacional Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Diretor do Centro de Direito Internacional.
3 M. Virally, ‘Sur la validité du droit et son fondement (norme fondamentale hypothétique et droit international)’ , Recueil d’études en
hommages à Charles Eisenmann, Cujas, 1975, pp. 453-467.
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de normas pode não ser uma ordem jurídica, assim como um conjunto de folhas e
galhos pode não ser uma arvore4 (cogitar substituição de metáfora).
De fato, não sendo a função da norma apenas a de criar obrigações, mas igualmente
a de estabelecer direitos, instituir poderes, criar órgãos e procedimentos, como
determinar que ela o faça de forma coerente, uniforme e sistemática? Como reconhecer
a existência de uma determinada ordem jurídica internacional? Em outras palavras
como verificar que uma determinada obrigação internacional é de origem normativa,
ou seja, dotada de força e natureza obrigatória? Qual é o elemento que distingue uma
obrigação normativa oriunda do sistema jurídico internacional? Como determinar que
uma obrigação de fato vincula e esta integrada ao sistema internacional?
O problema será, portanto o de identificar a fonte de obrigatoriedade da norma
internacional e de relacioná-la ao sistema normativo de origem. Existem, é claro,
diferentes pontos de vista doutrinários acerca desta questão. Contudo, há um acordo
de base. A natureza soberana das entidades que compõem a sociedade internacional
impõe o consentimento direto ou indireto do autor da norma como elemento essencial
na formação do direito internacional visto como norma e sistema. A jurisprudência
da C.I.J. relativa ao estabelecimento de sua competência é um bom exemplo da força
do vínculo entre o consentimento e a autoridade normativa. Assim, como sublinha a
C.P.I.J. no Parecer Consultivo relativo ao Statut de la Carélie Orientale:
‘(...) está bem estabelecido no direito internacional que nenhum
Estado poderia ser obrigado a submeter suas controvérsias com os
outros Estados seja à arbitragem, seja, enfim, a não importa qual
procedimento de solução pacífica, sem seu consentimento.’5.
De fato, a necessidade de um consentimento dos Estados partes, para que a Corte
possa exercer sua competência contenciosa, é lembrada sistematicamente e em termos
categóricos pelas duas Cortes. Assim, no caso Droits des Minorités en Haute-Silésie, a
Corte assinalou que: ‘a jurisdição da Corte depende da vontade das Partes’6. No caso
Or monétaire pris à Rome em 1943, a Corte declarou que:
‘não podia exercer sua jurisdição relativa a um Estado a não ser com
o consentimento deste último’7. Finalmente, a C.I.J. constatou, na sua
sentença de 30 de Junho de 1995, no caso do Timor Oriental, que não
teria competência para julgar um litígio entre dois Estados ‘sem que
estes tenham consentido na sua jurisdição’8.
4 M. Virally, ’Sur La prétendue ‘primitivité’ du droit international‘, Recueil de travaux, mémoires publiés par la Faculté de droit de Genève,
1969, pp. 201-213.
5 C.P.J.I. Série B, nº 5, p. 27
6 C.P,I.J. Série A, nº 17, pp. 37-38.
7 C.I.J. Rec. 1978, p. 9.
8 C.I.J. Rec. 1995, p. 101.
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