A Ação Monitória no Direito Brasileiro

AuthorEmmanuel Gustavo Haddad
PositionAdvogado Especialista em Direito Processual Civil - UNIVEM Professor Substituto da Faculdade de Direito das Faculdades

A ação monitória, instituto novo do nosso Direito Processual Civil, foi criada pela Lei 9.079/95 e incorporada no Código de Processo Civil, no Livro IV, Dos Procedimentos Especiais, do Capítulo XV.

Um dos motivos de sua criação foi à preocupação dos processualistas com um valor fundamental, ínsito à tutela dos direitos, imprescindível à efetividade do processo.1 Tomando-se assim, consciência da verdadeira função, que é destinada ao Estado, através do Judiciário, para desempenhar de maneira efetiva o seu papel de pacificar os conflitos, excluindo a morosidade processual, que atualmente é causa de descrédito da Justiça.

Por outro lado, o nomem iuris, ou seja, a natureza terminológica do citado instituto merece algumas considerações. Mantendo a terminologia do CPC, ao tratar dos procedimentos especiais, no Livro IV, o novo texto legal fala, incorretamente, segundo concepção moderna da ciência do direito processual, em ação monitória, no lugar de procedimento monitório. O Código sempre se refere, ao disciplinar os procedimentos especiais, em "ação de consignação em pagamento" (art. 890), "ação de depósito" (art. 901), "ação de anulação e substituição de títulos ao portador" (art. 907), "ação monitória" (art. 1102a), rotulando impropriamente as consideradas "ações especiais", misturando os conceitos de ação e de pretensão, quando especial é o procedimento e não a ação (leia-se, pois, procedimento de consignação em pagamento, procedimento de depósito, procedimento de anulação e substituição de títulos ao portador, procedimento monitório, etc). Ação é sempre o direito de se exigir do Estado um pronunciamento de mérito, o que não pode ser confundido ou atrelado ao direito subjetivo material alegado pelo autor como sustentáculo da pretensão colocada à apreciação jurisdicional, retratada no pedido formulado na petição inicial.2

Nesse prisma a lúcida observação doutrinária de ERNANE FIDÉLIS DOS SANTOS, merece ser transcrita, in verbis:

"Ainda se usa nas petições iniciais apelidarem-se as ações. Ação ordinária de cobrança, ação reivindicatória, ação confessória, ação pauliana, ação revocatória, ação de depósito, ação de usucapião, etc. A técnica, contudo, é condenável, porque, na moderna concepção de processo, ação é simplesmente direito de solicitar prestação jurisdicional .3

Não há necessidade alguma de se dar nome à ação. É Irrelevante a referida prática, pois, ainda que se use este ou aquele apelido, o julgamento vai se limitar exclusivamente ao pedido formulado.

A importância de qualquer qualificativo revela-se no pedido, através do qual a pretensão é formulada. Por ele, não apenas se orienta a prestação jurisdicional, o julgamento da lide, mas também a forma procedimental a se adotar, dentro dos critérios estabelecidos de fungibilidade e infungibilidade dos procedimentos.

Entretanto, nosso Código, ao tratar dos procedimentos especiais, manteve a tradição romanística, dando nome às ações, quando deveria se manter como procedimentos.

Dessa forma, cumpre mencionar que a ação monitória possui um procedimento especial e célere de natureza condenatória, para a formação do título executivo. 4

Portanto, neste artigo se utilizará ambas as formas.

O tema do presente trabalho, trás alguns aspectos polêmicos, e antes de adentrar aos estudos da ação monitoria propriamente dita, faremos um breve apanhado da parte histórica, buscando um maior entendimento ao tema.

Por sua vez, o procedimento monitório possui uma tutela diferenciada, que é a inversão do contraditório, que no caso de inércia do réu, se constitui de pleno direito o mandado injuntivo, em título executivo.

A ação monitória complementa a reforma do Código de Processo Civil, no que diz respeito aos artigos 461 (obrigação de fazer e não fazer) e art 461-A (obrigação de entregar coisa certa), imprimindo desde o início, rito especial às pretensões de pagar soma em dinheiro, entregar coisa fungível ou determinado bem móvel, que, em face da prova escrita, fazem supor que o devedor não irá se opor ao cumprimento da ordem.5

Esboço histórico da ação monitória
Direito Romano

Divide-se em o processo civil romano em três períodos: o da legis actiones, o per formular e do extraordinário cognitio .6

O da legis actiones esteve em vigor desde a fundação de Roma até os fins da República.7

O per formulas introduzido pela Lex Aebutia e foi oficializado pela Lex Julia privatorum, sendo aplicado de modo esporádico até a época do imperador Diocleciano.8

E o extraordinário cognitio que nasceu com o advento do principado e vigorou até o final do império romano do ocidente.9

Das três fases a mais importante para o nosso estudo é a da per formulas, pois a partir dessa efetivou-se os poderes do pretor, como o de proibir e ordenar certos atos. Assim com a evolução e as novas e exigências sociais ao pretor foi autorizado a instituir meios processuais de tutela pela observância da norma, ou até mesmo preencher lacunas desta.10 Essa evolução resultou nos interditos, procedimento interdital diante do pretor fosse semelhante ao ordinário, concluindo-se com a pronuncia do interdito; e que diversamente da actio, nem sempre exauria a questão, podendo, em momento subseqüente, converter-se em procedimento ordinário . 11

Em outras linhas o procedimento do interdito era um processo onde não se realizava a cognição da existência ou inexistência de um direito, mas sim um processo onde se mantinha o estado atual das coisas.12

Nota-se que no direito romano, somente a sentença de natureza condenatória, em processo de conhecimento, possui eficácia executiva.13 Por esse prima denota-se que o direito romano não teve a sorte de possuir institutos similares como o da ação monitória.14

Direito Italiano

Na Itália a ação monitoria recebeu o nome de procedimento d´ingiunzione, e como no Brasil está recepcionado no Código de Processo Civil daquele País.

Por sua vez o procedimento monitório italiano, tutela determinados direitos de crédito, caracterizando como procedimento monitório documental, haja vista que se exige do autor a comprovação do crédito alegado, limitando o procedimento somente aos créditos de importância determinada em dinheiro ou coisas fungíveis, e entrega de bem móvel determinado , excluindo-se os que tutelam obrigações de fazer ou não fazer, prestações de bens infungíveis ou imóveis.15

Nesse sentido a ação monitória é caracterizada como uma via alternativa da ação condenatória.16

O procedimento se resume, frente ao regular pedido, da expedição da ordem de pagamento da soma em dinheiro ou entrega do bem móvel ou a quantidade de coisa fungível requerida, autorizando neste último caso a alternativa de pagamento do valor, tudo no prazo de 20 (vinte) dias, opondo-se contra o mandado ou submetendo a execução forçada.17

No direito italiano, há a possibilidade, antes da oposição do réu contra a ordem de pagamento ou entrega do bem, de se realizar a execução provisória.

Uma vem descrita pela verossimilhança do fato alegado ao direito de crédito, a outra vem estampada no perigo de dano decorrente da demora. Salienta-se que essa execução provisória depende de requerimento expresso do requerente.18

Existe uma terceira hipótese, que se configura na ausência de credibilidade da defesa.19

A oposição aqui tratada é um juízo de cognição plenária, que se processa perante o mesmo órgão que emanou a ordem de pagamento. 20

A oposição se processa de acordo com o procedimento ordinário, podendo versar sobre matéria de fato ou processual, e uma vez interposta suspende a ordem de pagamento. Entretanto a oposição por possuir um juízo de conhecimento não impede a composição das partes. Não existindo pagamento e nem oposição o mandado executivo se confirma.21

Pelo discorrido, verifica-se que o nosso processo civil, em especial a ação monitória, teve sua origens baseadas no direito italiano, face às características semelhantes.

Direito Alemão

O direito alemão consagra o procedimento monitório, em um procedimento simples destinado a criar um título executivo para créditos irrefragáveis. Esse modelo de procedimento é reconhecido como procedimento monitório puro, que é o documental, originado do direito italiano.22

Possui as mesmas características do procedimento italiano, podendo inclusive instaurada oralmente. A diferença paira no caso de não existir oposição, uma vez que a ordem de pagamento não adquire a eficácia de título executivo, aguardando-se nova manifestação do autor para tornar a ordem executável, dessa maneira passa a execução a ter natureza provisória, garantindo ao devedor o oferecimento de exceção.23

Direito Português

Foi introduzido no direito português a partir das Ordenações Manoelinas com o nome de ação de assinação de dez dias.24

A ação de assinação de dez dias poderia ser proposta no caso do credor requerer o pagamento de quantia certa ou coisa determinada, através dos seguintes requisitos: escritura publica ou alvará feito e assinando. 25

Assim presentes os requisitos acima mencionados, o réu era citado para em dez dias, efetuar o pagamento ou provar a quitação do débito, por meio dos embargos. O prazo de dez dias contava-se a partir da audiência, momento este em que o réu comparecia e confirmava que a assinatura colocada no documento provinha de seu próprio punho. O seu não comparecimento à audiência, era tido como o reconhecimento da assinatura no documento.26

É evidente que...

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