O elemento subjetivo nas excludentes de ilicitude e a necessidade de sua quesitação nos processos a serem julgados pelo Conselho de Sentença no Tribunal do Júri

AuthorJorge Luís De Camargo
1- Do Conceito De Crime

Superando o causalismo então vigente, os adeptos do finalismo iniciado por Welzel, passaram a considerar o dolo e a culpa não como espécies de culpabilidade, mas sim como formas de conduta, posto que o que seria doloso ou culposo é a conduta inicial do agente. O dolo que para a teoria causal era normativo, posto que ao "querer do agente" agregava-se a necessidade da "consciência da ilicitude" passou a ser simplesmente natural, ou seja, agora sem esse elemento normativo, para ser apenas simples "querer" do agente. A consciência da ilicitude foi parar na culpabilidade, mas recebida como Potencial Consciência da Ilicitude.

A culpa, também passa a ser vista como forma de conduta, posto que o agente mesmo não o querendo, mas por imprudência, imperícia ou negligência dá causa ao resultado, responde pelo delito na forma culposa, se prevista no tipo penal, posto que violou o dever objetivo de cuidado. Para saber se o sujeito agiu ou não com culpa, deve ser feito um juízo de valor sobre sua conduta, uma valoração levando-se em conta o que um "homem médio" faria no lugar do causador, isto é, se a média da sociedade agiria da mesma forma que o agente e em caso de resposta afirmativa, o causador do resultado não deve ser responsabilizado. Por sua vez, se constado que o correto seria um agir ou mesmo um agir mais cuidadoso, haverá então responsabilidade pela conduta culposa do agente.

Em razão da necessidade de se fazer esse juízo de valor acerca da conduta do sujeito causador do resultado, a culpa passou a ser o elemento normativo da conduta.

Visto as principais novidades do finalismo, Damásio de Jesus ensina que os adeptos desta teoria consideram o conceito analítico de crime como sendo o fato típico e ilícito, sendo a culpabilidade um juízo de reprovação do sujeito ligado a fato típico e ilícito, portanto, para a existência de crime bastaria que o sujeito cometesse um fato típico e ilícito. Alguns autores, dentre eles Francisco de Assis Toledo, também adeptos do finalismo, consideram que o crime não tem apenas esses dois elementos, mas sim três, posto que a culpabilidade também seria elemento de existência do crime, são os adeptos da chamada teoria tripartite do delito.

A importância de se saber se o crime é composto de apenas dois elementos (teoria bipartite) ou de três (teoria tripartite) é demonstrada pelo clássico exemplo de Damásio de Jesus e mais precisamente no tocante ao delito de receptação dolosa de produtos roubados por um menor de idade, posto que se considerarmos a culpabilidade como sendo elemento do crime, o menor, por ser inimputável, portanto sem culpabilidade, não teria cometido crime algum e consequentemente quem adquirir dolosamente os bens por ele roubados não terá cometido receptação. Agora, se adotarmos a teoria bipartite do conceito de delito, veremos que o menor cometeu um fato típico e ilícito, portanto um crime e mesmo não sofrendo o juízo de reprovação de sua conduta, ou seja, não tendo culpabilidade, quem adquirir o produto do delito poderá responder por crime de receptação, ainda que o menor não responda pelo crime principal, sendo este o posicionamento da maioria da doutrina brasileira, como se observa analisando as obras de Fernando Capez, Luiz Régis Prado e o próprio mestre Damásio Evangelista de Jesus, portanto, este será o conceito seguido no presente trabalho.

2- Do Fato Típico

Uma vez analisado o que seria crime para o finalismo, passamos a uma breve síntese do seu primeiro elemento, mais precisamente o fato típico, que é composto de: a) conduta humana, comissiva ou omissiva, dolosa ou culposa, voluntária e consciente voltada para determinada finalidade; b) resultado naturalístico (nos delitos materiais) ou jurídico; c) nexo causal entre a conduta do agente e o resultado e d) que a conduta esteja anteriormente prevista em uma lei penal, ou seja, tipicidade.

Assim, o sujeito que fazendo uso de uma de fogo, dispara uma vez contra terceira pessoa, dando causa ao seu óbito, cometeu fato típico, posto que: a) realizou uma conduta comissiva dolosa ou culposa (disparo de arma de fogo); b) essa conduta gerou uma conseqüência ( nexo causal); c) a conseqüência foi o óbito do terceiro (resultado) e d) há previsão legal da conduta do agente no Art. 121 do Código Penal, portanto tipicidade.

Uma vez realizado o fato típico, por si, não basta para que o sujeito responda pelo delito, posto que, quer pela teoria bipartite do crime quer pela tripartite, o cometimento de um fato típico, não significa a realização de um delito o sujeito cometeu um crime, uma vez que fato típico só interessa para direito penal se acompanhado da ilicitude.

3- Da Ilicitude

Só é possível falar em análise da ilicitude de determinada conduta, para fins de direito penal, se for típica. Uma vez averiguado tratar-se de conduta típica, devemos passar apurar se também é ilícita, isto é, se há uma relação de contrariedade entre o fato típico e o ordenamento jurídico.

Conforme acima já exposto, somente interessa estudar a ilicitude de um determinado comportamento se, antes de tudo, for típico. Como a análise da ilicitude recai apenas sobre fatos típicos, não podemos esquecer que somente os fatos mais graves para preservação da sociedade são reprimidos pelo direito penal, segundo princípio da Intervenção Penal Mínima.

Ora, como bem ensinado por Max Ernst Mayer, citado por Damásio de Jesus, se determinada conduta é sancionada pelo ordenamento jurídico a ponto de ser prevista em um tipo penal, quer dizer que uma vez realizado o fato típico, surge indícios que a conduta viola o ordenamento jurídico, posto que em todos os tipos penais incriminadores existem mandamentos proibitivos implícitos.

Pelo princípio da reserva legal ( nullum crimen, nulla poena sine lege), o que deve vir expresso pela norma penal é a conduta e a pena abstratamente prevista para ela. Assim, por exemplo, o tipo de furto previsto no Art. 155 do Código Penal consiste em "subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel", sendo que o mandamento proibitivo implícito ou oculto é o de " não furtarás", o mesmo ocorre no exemplo de um sujeito vir a matar alguém, pois sua conduta é prevista no tipo do Art. 121, sendo que este artigo do Código Penal contém uma regra proibitiva implícita consistente em "não matarás".

Se todo o tipo penal incriminador prevê implicitamente um mandamento proibitivo, uma vez realizado o tipo, consequentemente o mandamento proibitivo de imediato também foi violado. Daí porque, uma vez realizado o comportamento típico, surge indícios de que a conduta...

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